Os resultados de um inquérito agora divulgado demonstram que muito está ainda por fazer no domínio da informação e sensibilização para a problemática do VIH/Sida em Portugal.
Um em cada 10 estudantes universitários de Coimbra acredita que a pílula anticoncepcional protege da infecção por VIH/Sida, segundo um inquérito da investigadora Aliete Cunha-Oliveira, da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.
Em declarações à agência Lusa, a autora referiu que a "desculpa" da contracepção oral para não usar preservativo "é, sem dúvida, um dado preocupante" e garantiu não compreender de "onde pode ter vindo tal ideia".
"Creio que esse dado terá de fazer pensar os criadores de mensagens e os responsáveis pelas políticas de prevenção e de saúde dos adolescentes e jovens", alertou Aliete Cunha-Oliveira, lembrando que a esta realidade "pode não ser alheio o modelo da oferta de serviços de saúde" centrado na prevenção da gravidez ou no rastreio de infecções e cancros da mulher jovem.
Para o não uso do preservativo, 13% dos jovens apontaram a questão do preço. Outro resultado indica que 41% dos jovens manifestou "embaraço" em adquirir o preservativo dentro da faculdade.
No inquérito a 696 estudantes das oito faculdades da Universidade de Coimbra, a investigadora concluiu que mais de metade (52,6%) diz usar sempre o preservativo, mas estes continuam a ser "dados preocupantes e que não têm nada de especialmente encorajador".
"Na melhor das hipóteses, 40% dos jovens universitários não usam o preservativo ou não o usam de forma consistente. São muitos jovens que se põem em risco e põem em risco os outros", resumiu a investigadora à Lusa, dando conta de que os resultados dos estudos não têm mostrado evoluções significativas.
Por isso, Aliete Cunha-Oliveira defende que "o modelo de luta e de campanha contra à infecção e doença atingiu, ou está próximo de atingir, o seu limite de intervenção", o que mostra a necessidade de rever a base que tem servido de "guião à luta contra a Sida em Portugal".
"Tem-se apostado demasiado no uso do preservativo, exclusivamente. E isso é manifestamente insuficiente", considerou a investigadora, atribuindo "algum significado optimista" à taxa de 30% de realização de testes ao VIH, por ser a única forma de as pessoas confiarem umas nas outras.
"Outra aposta fundamental terá que assentar numa educação de responsabilidade e de respeito por si e pelo outro", concluiu.
Quanto a comportamentos sexuais segundo o género, os rapazes referem ter mais parceiros sexuais, mais relações ocasionais e sob o efeito de álcool ou de outras drogas, mas usam mais vezes o preservativo. As raparigas, por seu lado, são predominantemente monógamas e assim tendem a não usar preservativo porque confiam na relação e no parceiro.
Em questão de informação, mais de 50% registou resultados elevados no teste de conhecimentos, superior a 17 valores, numa escala de 0 a 20.
Mas os altos níveis "são um tanto enganosos" quando relacionados com os comportamentos. No inquérito "algumas respostas revelam ignorância enquanto outras indiciam comportamentos de risco": mais de 30% garante que quem consome álcool e outras drogas não tem mais tendência a praticar sexo sem protecção, mais de 26% acredita que o vírus VIH não aparece no sémen e 18% nega que haja perigo de infecção na prática desprotegida de sexo oral.
No seu estudo, que serviu de base para a tese de mestrado, Aliete Cunha-Oliveira indicou ainda "novos mitos sobre o VIH/sida", que traduzem uma "visão demasiado optimista".
"De certo modo, parece estar em curso uma negação social e psicológica do problema do VIH/Sida, que faz com que as pessoas pensem e se comportem como se já houvesse vacina, como se já existisse tratamento eficaz e inócuo e como se a Sida fosse uma doença banal", afirmou a investigadora, referindo que os novos mitos são fruto de mensagens da comunicação social e "pressão das ideologias".
Aliete Cunha-Oliveira trabalha há 10 anos com jovens, quer no Centro de Saúde, quer no Centro de Atendimento de Jovens de Coimbra e constatou que embora tratando-se de estudantes com um "nível intelectual diferenciado, apresentam um número elevado de comportamentos de risco". "Fui constatando que, apesar de o preservativo ser distribuído gratuitamente, a solicitação por parte dos jovens é baixa", referiu.
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